O homem, o sertão e a cidade, por Moacir Assunção Notícias

06/11/2017 00:00

A Escola de Contas do TCMSP abriu na última sexta-feira, 27 de outubro, sua mais nova série chamada "Bate-papo com o autor". Em sua primeira edição, o evento contou com a presença do professor Moacir Assunção Filho que falou ao jornalista Djair Galvão sobre "A migração nordestina para São Paulo e sua importância na história da cidade", com base no lançamento do livro "Moacir Assunção, o homem, o sertão e a cidade grande".

A trajetória de Moacir Assunção pai está intimamente ligada à história da migração nordestina a São Paulo. Isso porque o cearense chegou à cidade com a segunda leva de migrantes daquela região, em 1949, aos 21 anos. "O primeiro grande grupo de nordestinos chega a São Paulo nos anos 1930. Depois, na década de 40, chega outro, do qual meu pai faz parte. Uma parcela desse grupo segue para o Rio de Janeiro. Os paraibanos, principalmente, e isso faz com que todos os nordestinos lá fiquem conhecidos como paraíbas", contou o biógrafo, filho do personagem.

Como agricultor, Moacir consegue parte do dinheiro para dirigir-se a São Paulo. "O dinheiro que faltava, um primo emprestou para ele e veio junto. Ele vem, inicialmente, de pau-de-arara até Minas", relatou. Chegando ao estado, o pau-de-arara quebra, o motorista e o agenciador desaparecem e os viajantes resolvem invadir o trem baiano que seguia para o destino final.

Entre as várias aventuras, o professor conta a que levou seu pai a dormir na rua. "Ele é contratado para trabalhar em uma plantação na região de Adamantina, mas o sonho dele era ficar na capital. Então conhece uma pessoa que diz ter um amigo garçom em São Paulo, profissão muito nobre na época", afirmou o escritor. Moacir, pai, briga com o primo, vende sua roça para pagar a dívida da passagem e vai embora procurar o garçom que morava na Vila Prudente. "Todo o dinheiro que tinha foi gasto no táxi que o levara até Vila Prudente." Quando o cearense chega ao local, descobre que o rapaz era um servente de pedreiro desempregado. "Meu pai sai sem dinheiro, sem documento e fica morando na rua. Para não morrer de frio, dorme em uma delegacia", contou o também historiador.

O homem pernoita na cela durante aproximadamente 15 dias e, nesse período, consegue emprego como servente de pedreiro na casa de uma família. O pai dessa família queria registrá-lo como filho, mas Moacir não aceitou, lembrando-se de sua mãe no Ceará. “Ele queria voltar para lá, ficaria no máximo dois anos em São Paulo e retornaria para construir sua carreira.” Quando volta, torna-se comerciante, seu grande sonho, e chega ao cargo de vice-prefeito e presidente da Câmara de uma cidade do interior de Pernambuco, local em que nascem todos os seus filhos.

Para chegar aos grandes cargos, Moacir teve que ficar famoso. Conseguiu isso ganhando no jogo do bicho com um bilhete de realejo no Ipiranga. "Eu quase dei esse título para o livro: ‘Pela sorte de um realejo’". Segundo Filho, o pai estava no Museu do Ipiranga quando avistou um tocador de realejo. Chegou perto e acabaram "tirando a sorte" do moço. Resultado: disseram-lhe para apostar no bicho. "Ele chega à lotérica e aposta o dinheirinho que sobrou. No outro dia, enquanto preparava a massa na obra, uma pessoa passa e grita que 'deu veado na cabeça. Número tal'."

O homem ganhou. "Ele nunca tinha visto tanto dinheiro na vida", afirmou o autor. Moacir decide mandar 80% do dinheiro para a mãe e fica com 20% para sobreviver. "Com esse dinheiro, a mãe dele compra 17 sacos de farinha e vai montar sua primeira bodega. Essa bodega vai se chamar, muitos anos depois, Casa Assunção (a casa que o projetou na cidade). Fica conhecido em Trindade como um dos homens mais ricos naquela época."

Volta ao Ceará como vencedor. "Quando chega está acontecendo um casamento, mas ele é tão famoso que todo mundo abandona o casamento para cumprimentá-lo." Moacir traz as novidades de São Paulo e o propósito de casar-se. "Ele volta também por causa dela [Antonia Pereira Assunção] e se casa”, relatou.

Em Trindade, instala-se e consolida sua carreira de comerciante, até entrar na política e candidatar-se, inicialmente, a vereador. Perde muito dinheiro na campanha. “Entramos na decadência financeira. A gente acabou saindo da cidade e ele tentou a vida como ambulante em Taubaté, até que um amigo volta para buscá-lo, pois saiu o resultado da eleição para vereador", contou. O comerciante volta, então, para a cidade e fica mais um mandato.

Depois, resolve voltar a São Paulo por reconhecer que é "a cidade do futuro". "A gente consegue comprar um apartamento da COHAB 2, e lá nos instalamos por alguns anos. Em seguida, meu pai vende esse imóvel e compra um na COHAB 1, que é onde mora até hoje, no bairro de Artur Alvim."

O filho do casal de cearenses emociona-se ao falar da mãe, já falecida, e do impasse que viveu com o enterro de d. Antonia em meio aos ataques do Primeiro Comando da Capital (PCC), em 2006. Define o pai com enorme orgulho, dizendo que o homem é uma pessoa íntegra, honesta e inteligente. "É um sentimento de orgulho ter vindo dessa origem e, mais ainda, ter conseguido contar essa história. Isso faz com que me sinta um privilegiado", finaliza lendo o poema que muito lhe emociona, chamado Terra Bárbara, de Jáder de Carvalho.

Assista o evento completo aqui.