Campanha da Fraternidade 2019 é apresentada pela Escola de Contas do TCMSP Notícias

17/04/2019 14:00

A Escola de Contas do Tribunal de Contas do Município de São Paulo (TCMSP), visando contribuir com o papel de aperfeiçoamento do controle externo e controle social das políticas públicas, abraçou a causa da Conferência Nacional dos Bispos do Brasil (CNBB) e organizou na segunda-feira (15/04) um debate com especialistas de variados segmentos da sociedade sobre a nova temática da Campanha da Fraternidade 2019: “Fraternidade e Políticas Públicas”.

Entre os presentes, o secretário executivo da Cáritas Brasileira Regional de São Paulo e assessor da Comissão Nacional da Campanha da Fraternidade da CNBB, Toninho Evangelista; o professor de Políticas Públicas da Universidade Federal do ABC e sócio da Anistia Internacional Brasil e da Campanha Latino-Americana pelo Direito à Educação (CLADE/Brasil), Salomão Barros Ximenes; e o diretor-presidente da Escola de Contas do TCMSP, Maurício Piragino.

Na perspectiva de que “praticar políticas públicas é, sobretudo, um ato de fé”, Toninho Evangelista confessou que a prática “sócio-política não tem sido fácil para a Igreja”. Isso acontece porque a Igreja Católica ainda é julgada por sua participação na política, fato que está intimamente ligado à construção da dignidade humana e a superação da dualidade entre fé e política.

A temática deste ano da Campanha da Fraternidade nasceu em função de cumprir esses objetivos e, também, fortalecer o processo de conversão. “Trazer para dentro da igreja a necessidade de uma conversão Quaresmal voltada às políticas públicas, porque é com ela que podemos avançar em relação à dignidade humana, não é uma tarefa fácil considerando a forma em que nos organizamos ou avançamos na nossa compreensão de fé. Mas a Igreja sugeriu para este ano a conversão às políticas públicas na perspectiva de que, ao avançarmos nelas, nos aproximaremos da dignidade humana, principalmente na efetivação de algumas políticas”, definiu o assessor da CNBB.

No processo de conversão, a Campanha da Fraternidade vai sugerir o ver, o julgar e o agir como método. “No agir, a primeira proposta é superar a dualidade entre fé e política e depois fazer controle social e participar efetivamente dos espaços na construção, no apontamento e na necessidade das políticas públicas", confirmou Evangelista. "Deveríamos compreender a pessoa humana na sua condição humana e não somente nas suas condições de fronteira", completou.

Na perspectiva do ver, a Campanha faz um resgate do caminho da sociedade e da forma como se aprende a interagir com ela, sempre vinculada à dimensão de poder. "Nosso texto traz esse jeito de se relacionar em sociedade para que possamos compreender os dias atuais, suas dificuldades e o quanto isso interfere na necessidade de avançarmos em algumas políticas públicas", disse Evangelista.

Sobre o agir, o secretário executivo trouxe indagações: “Aonde está o nosso irmão? Aonde está o nosso irmão LGBTI? Aonde está o nosso irmão sem moradia? Aonde está o nosso irmão encarcerado? Aonde está o nosso irmão em situação de rua? Temos coragem de afirmar, pelo menos, que sabemos aonde ele está?", questionou, ressaltando a necessidade do agir em relação ao processo de construção de identidade e reconhecimento do outro como irmão.

Outra face da Campanha sugere que muitas políticas de governo se transformem em políticas de Estado porque, segundo Evangelista, “sofremos com a interface de que haja, a cada quatro anos, mudanças e inversões de políticas que têm dado resultado".

Nesse contexto, a Igreja vai na contramão das atuais propostas de reforma. "Nós compreendemos que o congelamento de gastos não contribui para as políticas públicas. Os processos de terceirização também não. A reforma trabalhista não contribuiu para aquilo que se propunha. Também nos posicionamos de forma contrária à Reforma da Previdência considerando se ela é realmente necessária”, destacou. A Igreja Católica entende que as reformas, principalmente a previdenciária, potencializam o sofrimento das populações mais empobrecidas. “É dever da Igreja fazer a defesa dessas pessoas. Se a reforma assegurasse ou desenvolvesse a partir de assegurar que as pessoas mais empobrecidas avançassem, talvez a Igreja tivesse outro posicionamento. Mas, no cenário atual, entendemos que as reformas atendem as perspectivas do mercado e não necessariamente da pessoa humana”.

Por fim, Evangelista afirmou que a Campanha não pretende, de forma alguma, assumir os espaços do Estado, “agora, quando ele não cumpre o seu papel ou quando fica deficitário, cabe a ela se posicionar e levar adiante o que se propõe, principalmente vinculada à doutrina social da Igreja", reforçou, passando a palavra para o professor de Políticas Públicas, Salomão Barros Ximenes, que deu uma visão mais jurídica para as reflexões que a Campanha da Fraternidade se propõe a fazer, entre elas, de que o Estado brasileiro passa por uma crise significativa na qual há uma tentativa de mudança da sua natureza. “É impossível falar em políticas públicas, pensar políticas públicas, sua formulação, sua implantação e avaliação, a lógica do ciclo desconsiderando a conjuntura que estamos vivenciando que é de um contexto de crise decisiva sobre o projeto da Constituição de 1988", disse Ximenes.

As medidas versam sobre um desmonte do conjunto de políticas públicas até então adotadas. “As projeções mais ‘otimistas’ dão conta de que a partir de 2021 não haverá praticamente mais recursos da União para custeio da máquina pública e investimento em políticas sociais para além das despesas que já são obrigatórias a serem aplicadas nas remunerações e nas despesas de aposentadoria", lamentou o professor de Políticas Públicas.

O que o país já tem vivenciado é um rebaixamento ideológico da dignidade das pessoas, é a ideia de rebaixamento da cultura e das populações afro-brasileiras, das mulheres, dos migrantes, das pessoas que têm orientação sexual diferente daquela que é entendida como a comum por outra parcela da população. "Na redução do escopo das políticas e de direitos, que se vê o que o Toninho chama a atenção sobre a desumanização dos sujeitos e desconstrução da ideia de universalismo na garantia dos direitos humanos e sociais. [...] É a ideia, segundo a qual, nem todos são igualmente dignos e merecedores de participação na política, no Estado. O Toninho colocou isso nos termos da doutrina religiosa, eu coloco no contexto de igualdade, como cidadãos no Estado Democrático de Direito", ressaltou Ximenes.

Quanto a isso, o diretor-presidente da Escola de Contas afirmou que “precisamos tentar não naturalizar essas coisas para entender o foco”, pois, “a nossa Constituição de 1988 deu voz ativa ao soberano, e o soberano é o povo brasileiro”, completou. Mas, na prática, o povo brasileiro continua na arquibancada. “É pouco chamado para participar e ter uma cidadania verdadeiramente ativa e exercer o papel de soberano", considerou Maurício Piragino.

Ele acrescentou ainda: “Se não tivéssemos a participação ativa da Igreja Católica para situações como essas na política brasileira, não teríamos os avanços que temos em muitos pontos. "Não temos que questioná-los por participar da política, temos que questionar, talvez, como fazem a política", indicou Piragino.

Por fim, Ximenes destacou a necessidade de olhar para este chamado que faz a CNBB sobre pensar as políticas públicas, “mas não só pensar as políticas públicas na sua perspectiva técnico-processual-jurídica, mas pensá-las na dimensões da fraternidade, da igualdade e dos direitos, olhando para o desafio político que está colocado na sociedade brasileira, para este clima político e ideológico que é instalado visando separar a sociedade brasileira em dois segmentos: os que merecem participar e os que não têm dignidade suficiente para participar do projeto de sociedade”, estes são, “cidadãos de segunda classe, em um contexto altamente desafiador no qual, se não revogada a emenda constitucional 95, haverá paralisação da máquina pública do país", encerrou o professor.

O evento contou ainda com participação de uma representante da turma do curso de "Aperfeiçoamento de controle social em políticas públicas", Magali Rondoli, que usou da palavra para ressaltar a importância de instituições de ensino, como a Escola de Contas, que ensinam a sociedade a controlar o que é seu por direito. "Todos sabem que o Brasil não vai bem em Matemática e o deus do mundo hoje é o dinheiro. Se a gente não sabe lidar com o dinheiro, não sabemos fazer conta. Nessa linha, a Escola de Contas do Tribunal tem uma característica de vanguarda porque ela acredita que o controle social não deve ser feito somente por quem está no governo, mas por toda a sociedade", disse Rondoli.

Ao final do evento, todos os palestrantes receberam o certificado de participação pelas mãos da mediadora Antônia Conceição dos Santos.

Você pode conferir um texto sobre a Campanha da Fraternidade 2019, pela CNBB, aqui.

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