No Dia Internacional pela Eliminação da Violência contra a Mulher, Tribunais de Contas debatem avanços e desafios das lutas femininas Notícias

26/11/2021 10:00

O Tribunal de Contas do Município de São Paulo (TCMSP), em conjunto com o Tribunal de Contas da União (TCU), a Associação dos Membros dos Tribunais de Contas do Brasil (Atricon) e o Conselho Nacional de Presidentes dos Tribunais de Contas (CNPTC), promoveu, na manhã da quinta-feira (25.11), em ambiente virtual, o encontro “Desafios e avanços das políticas para mulheres”, para celebrar o Dia Internacional pela Eliminação da Violência contra a Mulher. A data (25/11) foi instituída pela Organização das Nações Unidas (ONU).

 

Na abertura do evento, a presidente do TCU, ministra Ana Arraes, lembrou que a efeméride presta homenagem às irmãs Mirabal (Pátria, Minerva e Maria Teresa), assassinadas em 1960 na República Dominicana pela oposição ferrenha que faziam à ditadura do presidente Rafael Trujillo. Destacou, ainda, a importância de ações pontuais dos órgãos de controle no combate à desigualdade de gênero. “A pandemia acabou por revelar uma triste realidade: o aumento de 40% dos episódios de violência doméstica. Em muitos lares, mulheres foram subjugadas pela força por companheiros que apostaram em seu silêncio. Como medida inaugural de minha gestão, ampliei às servidoras dessa Casa o acesso aos cargos de liderança, conseguindo dobrar, em relação ao ano anterior, as chefias de direção estratégica com mulheres à frente, equalizando a proporção do nosso corpo funcional”, revelou a ministra.

 

Ana Arraes também reforçou que o TCU vem realizando diversas iniciativas com potencial de impacto nas políticas públicas para mulheres em âmbito regional e nacional.

 

Vice-Presidente de Relações Jurídico-Institucionais da Atricon, a conselheira substituta do Tribunal de Contas do Estado de Goiás (TCE-GO), Heloísa Helena Godinho, destacou que não faltam leis e programas em prol das mulheres, mas sim um pacto coletivo público e privado para a implementação de medidas efetivas sobre o tema. “O sucesso das políticas públicas para as mulheres acontecerá somente quando superarmos o triste índice de violência de gênero e tivermos ofertas suficientes de oportunidades para que exerçamos nossa independência financeira, social e de ideias. Os Tribunais de Contas, capitaneados pelo TCU, são atores importantes nesse aspecto, reunindo esforços e conclamando a sociedade, os governos e as autoridades para atuar conjuntamente em torno do objetivo de não deixar nenhuma mulher e menina para trás”, disse ela.

 

O presidente do TCMSP, conselheiro João Antonio da Silva Filho, afirmou que para o Sistema de Controle dos Tribunais de Contas o desafio é assumir e incorporar o tema como um marcador no desenvolvimento das suas atividades de fiscalização das contas públicas. “Esse debate requer ações pontuais dos poderes públicos e também políticas públicas que possam incidir na construção de uma sociedade na qual a igualdade entre homens e mulheres seja uma premissa. É papel do Estado e dos demais agentes garantir uma abordagem intersetorial, em que todas as dimensões da violência possam ser reconhecidas e enfrentadas”, completou.

 

João Antonio enfatizou, também, que é fundamental garantir programas e recursos públicos no ciclo orçamentário para a efetivação do direito das mulheres em situação de violência. “Se faz necessário que o Estado brasileiro adote políticas públicas acessíveis a todas as mulheres, englobando as diferentes modalidades pelas quais a violência se expressa. Cabe aos Tribunais de Contas fiscalizar, não somente sob o prisma da legalidade, economicidade e legitimidade, mas também a partir da análise dos resultados concretos dessas políticas públicas. O papel do Estado é determinante na construção da igualdade, mas não só na regulação das leis que coíbem a discriminação, também como agente de mudanças culturais e das condições de vida das mulheres”, reforçou o conselheiro.

 

Anastasia Divinskaya, representante da ONU Mulheres Brasil, entidade das Nações Unidas para a igualdade de gênero e o empoderamento das mulheres, falou sobre o lançamento da campanha “16 Dias de Ativismo pelo Fim da Violência contra as Mulheres”, em que a ONU Brasil irá divulgar, até o dia 10 de dezembro, o processo de invisibilidade e violência que as mulheres e meninas têm enfrentado antes e durante a pandemia da Covid-19. A campanha é inspirada na canção “O que se Cala”,  de autoria de Douglas Germano, e interpretada por Elza Soares.

 

De acordo com Anastasia, a campanha pretende mobilizar toda a sociedade a partir da sua atuação individual. “Monumentos também serão iluminados de laranja, que é a cor oficial da campanha, simbolizando a esperança por um mundo livre de violência”, explicou ela.

 

A representante da ONU reforçou que o clamor deve ser acompanhado de ação. “É desolador saber que a violência é sistemática no Brasil. Em 2020, 16 milhões de mulheres brasileiras foram vítimas de algum tipo de violência, seja física, psicológica ou sexual. Desse total, 44,9% delas reportaram que nada fizeram em relação à agressão sofrida e apenas 11,8% buscaram as autoridades competentes. De acordo com Observatório de Igualdade de Gênero da América Latina e do Caribe, o Brasil é o país com o maior número absoluto de feminicídios na região. A violência é amplamente difundida e se manifesta de múltiplas formas e em todas as esferas”, completou.

 

Pesquisadora da Fundação Joaquim Nabuco, a economista Cristina Buarque, militante feminista que atuou em exílio no Chile e na Alemanha na década de 1970, destacou que a violência contra as mulheres não é característica da contemporaneidade, mas da civilização masculina no mundo. “Precisamos mudar a civilização para mudar a violência. O início do enfrentamento está no movimento organizado da sociedade civil que se traduz no feminismo. Precisamos mensurar os avanços a partir da demanda do movimento feminista. Não nos damos conta do quanto estamos sendo contra o movimento e é ele que constrói a organização das mulheres. Todas as questões levantadas pelas mulheres foram maneiras de enfrentamento à violência civilizatória do patriarcado. As mulheres foram as grandes protagonistas da luta contra as desigualdades”, avaliou a especialista, que é doutora em Antropologia Social e mestre em Políticas Públicas.

 

Com relação à atuação do TCU no auxílio ao aperfeiçoamento das políticas públicas de combate à violência contra as mulheres, a auditora de Controle Externo do órgão, Dione Mary de Cerqueira Barbosa, apresentou algumas iniciativas realizadas, como a auditoria operacional sobre ações de enfrentamento à violência doméstica e familiar, desenvolvida em 2012. “A ideia da auditoria é que fossem identificadas as boas práticas e que fossem registrados e acompanhados os espaços, as instalações e os equipamentos existentes nos centros de referência e nas casas de abrigo e de reabilitação de agressores”, ressaltou.

 

Especialista em Políticas Públicas, Gestão da Educação Corporativa e Gestão do Conhecimento e mestre em Novas Tecnologias Educacionais, Dione também mencionou a auditoria operacional sobre a preparação do Governo Federal para a implementação do Objetivo de Desenvolvimento Sustentável (ODS) 5, que trata da igualdade de gênero e empoderamento de mulheres e meninas.

 

“O poder Executivo tem por função a formulação das políticas públicas, enquanto o Judiciário atua na garantia de direitos e resolução de conflitos e o Legislativo avalia e fiscaliza as ações. Do ponto de vista de organização, o tema de políticas públicas para as mulheres perpassa todos os poderes do Estado”, assegurou a auditora.

 

A coordenadora do grupo de trabalho sobre igualdade de gênero e não discriminação da Olacefs - Organização Latino-Americana e do Caribe de Entidades Fiscalizadoras Superiores, Daniela Santana Silva, falou da pesquisa que realizaram acerca da percepção de gênero das pessoas que trabalhavam nas Entidades Fiscalizadoras Superiores (EFS). “O diagnóstico mostrou que as pessoas não entendiam o que exatamente se inseria na temática de igualdade de gênero e que se nas suas unidades haviam protocolos institucionais para denúncias de violência sexual, não eram utilizados por não acreditarem que seria a melhor forma de reparação. Os resultados mostraram a necessidade de capacitação para melhorar os canais de comunicação e denúncia”, avaliou.

 

De acordo com Daniela, o grupo, criado pelo Conselho Diretivo em 2020, a partir da junção dessa pesquisa com informações de outro levantamento em torno do tema, iniciou a construção de uma Política sobre Igualdade de Gênero e Não Discriminação. “Esperamos que o documento seja um instrumento orientador para o planejamento institucional tanto da Olacefs como das Entidades Fiscalizadoras que a compõem.  É uma diretriz que gera um estudo de factibilidade e reúne 103 recomendações, estruturadas em recomendações transversais e seis eixos de trabalho, entre eles: cultura ética, organizacional e gestão de pessoas. Também faremos o acompanhamento e monitoramento da aplicabilidade dessa política, para que as recomendações não fiquem só no papel e sejam realmente efetivas”, avaliou a palestrante, que atua como advogada na Comissão Interamericana de Direitos Humanos e é especialista em Igualdade e Não discriminação, com enfoque em grupos vulneráveis.

 

O presidente do CNPTC, Joaquim Alves de Castro Neto, ressaltou que o encontro trouxe temas instigantes que poderão gerar iniciativas valiosas e norteadoras de projetos de implementação de políticas pautadas na valorização da mulher.

 

Após as exposições, foi realizado um debate a partir de questionamentos enviados pelos internautas ao chat do evento. A chefe de gabinete da Corregedoria do TCU, Ana Paula Sampaio Pereira, realizou a mediação do encontro, que foi transmitido pelo canal oficial do TCU no Youtube.

 

Leia aqui a íntegra do discurso do presidente do TCMSP

Assista aqui à participação do conselheiro João Antonio no evento